SOBRE LULA E O MENSALÃO.
UM TEXTO OBRIGATÓRIO ! DE FERREIRA
GULLAR

Publicado
ontem pela “FOLHA”, o texto magnífico de Ferreira Gullar, que, diga-se de
passagem, é de esquerda, talvez seja o que melhor definiu o presidente Lula nos
últimos tempos.
Quase uma
minibiografia. Leitura obrigatória para quem, de fato, quer conhecer a verdade,
escrita por alguém que foi testemunha ocular da história.
TAPAR O SOL - Por FERREIRA GULLAR
“O
julgamento do STF realiza-se à vista de milhões de telespectadores. Não é uma
conspiração”
GOSTARIA
DE deixar claro que não tenho nada de pessoal contra o ex-presidente Lula, nem
nenhum compromisso partidário, eleitoral ou ideológico com ninguém. Digo isso
porque, nesta coluna, tenho emitido, com alguma frequência, opiniões críticas
sobre a atuação do referido político, o que poderia levar o leitor àquela
suposição.
Não resta
dúvida de que tenho sérias restrições ao seu comportamento e especificamente a
certas declarações que emite, sem qualquer compromisso com a verdade dos
fatos. E, se o faço, é porque o tenho como um líder político importante,
capaz de influir no destino do país. Noutras palavras, o que ele diz e faz,
pela influência de que desfruta, importa a todos nós.
E a
propósito disso é que me surpreende a facilidade com que faz afirmações que só
atendem a sua conveniência, mas sem qualquer compromisso com a verdade. É
certo que o faz sabendo que não enganará as pessoas bem informadas, mas sim
aquelas que crêem cegamente no que ele diga, seja o que for.
Exemplo
disso foi a entrevista que deu a um repórter do “New York Times”, quando voltou
a afirmar que o mensalão é apenas uma invenção de seus adversários políticos.
E vejam bem, ele fez tal afirmação quando o Supremo Tribunal Federal já julgava
os acusados nesse processo e já havia condenado vários deles.Afirmar o que
afirmou em tais circunstâncias mostra o seu total descompromisso com a verdade
e total desrespeito com às instituições do Estado brasileiro.
Pode
alguém admitir que a mais alta corte de Justiça do país aceitaria, como
procedentes, acusações que fossem meras invenções de políticos e jornalistas
irresponsáveis?
E mais:
os ministros do STF passaram sete anos analisando os autos desse processo,
tempo mais que suficiente para avaliá-lo. Afirmar, como faz Lula, que tudo
aquilo é mera invenção equivale a dizer, implicitamente, que os ministros do
STF são coniventes com uma grande farsa.
Mas o
descompromisso de Lula com os fatos parece não ter limites. Para levar o entrevistador do
“NYT” a crer na sua versão, disse que não precisava comprar votos, pois, ao
assumir a Presidência, contava com a maioria dos deputados federais.
Não
contava. Os verdadeiros dados são os seguintes: o PT elegera 91 deputados; o
PSB, 24,; o PL, 26, o PC do B, 12, num total de 153 deputados. Mesmo com os
eleitos por partidos menores, cuja adesão negociava, não alcançava a metade
mais um dos membros da Câmara Federal.
Cabe
observar que ele não disse ao jornalista norte-americano que não comprou os
deputados porque seria indigno fazê-lo. Disse que não os comprou porque tinha
maioria, ou seja, não necessitava comprá-los. Pode-se deduzir, então, que, como na verdade
necessitava, os comprou. Não há que se surpreender, Lula é isso mesmo.
Sempre o foi, desde sua militância no sindicato. Para ele, não há valores: vale
o que o levar ao poder ou o mantiver nele.
Sucede
que, apesar do que diga, ninguém mais duvida de que houve o mensalão. Pior ainda,
corre por aí que o Marcos Valério está disposto a pôr a boca no mundo e
contar que o verdadeiro chefe da patranha era o Lula mesmo, como, aliás, sempre
esteve evidente. E já o procurador-geral da República declarou que, se os
dados se confirmarem, o processará. É nessas horas que o Lula falastrão se cala
e desaparece. Às vezes, chama Dilma para defendê-lo.
Desta
vez, chamou o Rui Falcão, presidente do PT, para articular o apoio dos líderes
da base política do governo. Disso resultou um documento desastroso, que chega
ao ponto de acusar o Supremo de perpetrar um golpe de Estado contra a
democracia, equivalente aos golpes que derrubaram Vargas e João Goulart. Pode?
Vargas e Goulart, como se sabe, foram depostos pela extrema direita com o apoio
de militares golpistas.
O
julgamento do STF realiza-se às claras, à vista de milhões de telespectadores.
Não é uma conspiração.
Ele desempenha as funções que a Constituição lhe atribui. E que golpe é esse
contra um político que não está no poder?
O tal
manifesto só causou constrangimento. O governador Eduardo Campos, de
Pernambuco, deu a entender que foi forçado a assiná-lo, após rejeitar três
versões dele. Enfim, mais um vexame. Só que Lula, nessas horas, não aparece.
Manda alguém fazer por ele, seja um manifesto, seja um mensalão.