Trezentos
metros separam o Palácio do Planalto da presidência do Supremo Tribunal
Federal, ocupado hoje por Joaquim Benedito Barbosa Gomes, o herói do
mensalão – o homem que muitos brasileiros gostariam de ver no outro lado
da Praça dos Três Poderes. Seria uma travessia inédita na democracia
brasileira.
Do amplo gabinete espelhado da presidência do
Supremo, no alto do Tribunal, os 300 metros se encolhem. É a ilusão que o
poder em Brasília confere. Parece bastar um pulinho. Mas requer um
salto suicida. Joaquim sabe disso. Por isso, resolveu: não será
candidato a presidente da República em 2014. Numa tarde recente e
chuvosa em Brasília, Joaquim recebeu, naquele mesmo gabinete, mais um
curioso em saber, afinal, quais são seus planos para 2014. Joaquim não
olhava a vista. Não tinha interesse. Olhava para os livros – como sempre
fez.
O interlocutor observou que Joaquim não teria aptidão para
entrar na política, ainda mais depois de conhecer, no processo do
mensalão, as sujas entranhas dos partidos brasileiros. Mesmo que
entrasse depois. Mesmo que num cargo menor – se a Presidência está a 300
metros, o Congresso está a apenas 100.
“Acho difícil”, afirmou
Joaquim. “Não me vejo fazendo isso (entrando na política algum dia). O
jogo da política é muito pesado, muito sujo. Estou só assistindo a essa
movimentação.” E deu um sorriso malicioso, como quem quer fazer os
adversários sofrer – leia-se, a turma do PT que o esculhamba
diuturnamente – com a perspectiva de ter de enfrentá-lo nas eleições.
“Deixem falar… Deixa falar… Não serei candidato a presidente. Realmente
eu não quero”, disse. “É lançar-se, expor-se, a um apedrejamento.”
O
apedrejamento a que ele se refere é diferente das pauladas que tomou à
frente do mensalão. Joaquim sabe disso. “Em 11 anos aqui, você aprende.
Adquire uma casca dura. Eu não tinha essa casca dura até há uns seis
anos. Isso vem com o tempo.”
Embora Joaquim discorde que suas
dores crônicas nas costas e nos quadris tenham relação com os rigores do
mensalão, é unanimidade entre seus amigos que o processo lhe custou
muito. As dores incomodam. E devem ser o principal fator que definirá a
provável aposentadoria precoce do Supremo, em novembro deste ano.
Joaquim pretende se aposentar quando deixar a presidência da Corte.
Joaquim
se incomoda também com o assédio de partidos como PV e PSB. Nunca
recebeu ninguém para conversar – nem autorizou que alguém falasse em
nome dele. “Ninguém veio diretamente falar comigo. Fui ao Congresso,
ouvi um zum-zum-zum. Está cheio de emissários que querem chegar”, disse
ele a um amigo. “Não recebo ninguém aqui.
Em primeiro lugar, acho
que não seria apropriado eu, como presidente do Supremo, sair por aí
fazendo negociações políticas. No dia em que sair daqui, estarei livre
para fazer isso. Enquanto eu estiver aqui, não. Em segundo lugar, não
dou nem nunca dei espaço para esses donos de partido ficarem… não,
nunca. São abordagens indiretas. A maior parte do que sei é pela
imprensa.”
Num momento em que o Supremo está dividido pelos
traumas do mensalão, existe apenas uma unanimidade entre todos os
ministros da Corte – uma unanimidade que se estende à Procuradoria-Geral
da República e aos amigos de Joaquim. Caso, por alguma razão
insondável, Joaquim mude de ideia e resolva entrar na política, será um
desastre para ele, para o Supremo e para a legitimidade do julgamento do
mensalão. Mas os ministros mais próximos dele, assim como todos os seus
poucos amigos de confiança, têm certeza de que ele diz a verdade quando
garante que não dará o salto de 300 metros. Nem o de 100.
Fonte: Época e NAÇÃO JURÍDICA