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Nação Jurídica

Desde que o homem começou a trocar serviços e produtos por dinheiro, o
consumidor é dotado de importância na sociedade. Seu papel nas relações
de consumo, entretanto, nem sempre foi valorizado. A fim atender às
necessidades de um país democrático e em desenvolvimento, tornou-se
imprescindível a implantação de um sistema jurídico para garantir sua
proteção: o CDC.
Cinco dias após o Código completar 23 anos em vigor, a data 15 de março
marca, mais uma vez, o hastear da bandeira em direção ao "atendimento
das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e
segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua
qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de
consumo" (art. 4ª, CDC).
Atento aos avanços tecnológicos e à ampliação das formas de consumo, o
comércio se torna, no contexto do século XXI, uma ferramenta poderosa e
perigosa frente à era digital. O cenário, cada vez mais fértil a novas
possibilidades e propício ao consumo, acabou por promover aumento da
variedade de produtos para suprir demandas, criar novas modalidades de
serviço, dar origem a diferentes hábitos e meios de comercialização, e
expandir as formas de atendimento. Simultaneamente, o consumidor ganhou
um poderoso instrumento de efetivação de seus direitos e uma via eficaz
para solucionar problemas.
A era dos desafios
"Muito embora as datas mereçam comemorações, o dia a dia dos
consumidores ainda está longe de ser tranquilo. Problemas antigos ainda
permanecem sem solução, como as deficiências nos serviços prestados
pelas concessionárias de telefonia, que comercializam planos 4g sem que a
internet 3g funcione adequadamente nos celulares e cuja cobertura de
serviço não atende a padrões mínimos de qualidade, porque as ligações
não se completam ou caem com frequência", observa o advogado e professor
da Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo, Arthur Rollo.
Rollo aponta ainda que descumprimentos de contratos acontecem
diuturnamente, sem que haja uma intervenção dura dos órgãos de defesa do
consumidor ou do Judiciário, assim como de prazos de entregas. "O
Judiciário enfrenta estas questões como incidentes que causam 'mero
aborrecimento' ao consumidor. Se há a lei e não há seu cumprimento, os
fornecedores não são coibidos e o problema provavelmente voltará a
ocorrer".
Outra área que representa um grande desafio à superação das
problemáticas neste território para o consumidor é o mercado de compra
de ingressos on-line, segundo o especialista. "Chegamos ao absurdo de as
empresas cobrarem taxa de conveniência para se comprar ingresso na
internet. A conveniência da compra na internet não é só do consumidor.
Também há uma redução de custo pra quem está vendendo por este meio".
O caminho percorrido pelos consumidores e fornecedores rumo à era
digital parece ser, de fato, irreversível. Em detrimento das melhorias,
como redução de custos e distâncias, para a advogada Letícia Zuccolo
Paschoal da Costa, do escritório Edgard Leite Advogados Associados, a
questão envolve uma dificuldade complexa : "Quanto mais se entra na era
digital, mais se exclui consumidores que estão fora dessa realidade".
Segundo a causídica, muitas empresas por estarem imersas na realidade
digital só oferecem, ou melhor oferecem, suporte vinculado à internet,
"o que prejudica os consumidores que não têm tanto acesso". "As relações
devem ser harmoniosas, como diz o próprio CDC".
Para a consultora executiva do Idec Elici Bueno, entretanto, a
harmonização da relação consumerista ainda está longe de ser realidade.
"O grande problema que enfrentamos é a eterna briga entre a defesa do
consumidor e a questão do consumo em si, do próprio movimento do poderio
econômico. O que nós percebemos é que temos um avanço na defesa do
consumidor, da percepção do reconhecimento desses direitos, e em
determinado momento, devido à insatisfação do capital, há um retrocesso
no direito do consumidor".
A era das conquistas
Apesar dos desafios e das dificuldades, a era digital concedeu ao
consumidor dois trunfos: a internet e a atenção dos legisladores.
Para Letícia Zuccolo e Arthur Rollo, a aprovação pela Anatel do
Regulamento Geral de Direitos do Consumidor de Serviços Telecomunicações
é um dos mais recentes importantes instrumentos da defesa dos direitos
dos consumidores. O Regulamento se propõe a aumentar a transparência nas
relações de consumo e ampliar os direitos de quem utiliza telefonia
fixa e móvel, internet e televisão por assinatura.
Entre as previsões, o consumidor passa agora a poder cancelar serviços
automaticamente pela internet ou pela central de atendimento sem
precisar falar com um atendente. Ainda de acordo com o texto aprovado,
todas as recargas de celular pré-pago terão validade mínima de 30 dias.
As operadoras também deverão oferecer duas outras opções de prazo de
validade de créditos, de 90 e 180 dias.
Em frente semelhante, outra recente medida protetiva sancionada no ano
passado deu um largo passo rumo à compatibilização das relações de
consumo com a era digital. "Neste contexto, destaque-se que importantes
alterações legislativas ocorreram visando à modernização e o
aperfeiçoamento do CDC, podendo-se citar como exemplo o decreto 7.962,
que regulamentou o CDC no que tange ao comércio eletrônico, reforçando
os direitos de informação, lealdade, autodeterminação, cooperação e
segurança nas relações de consumo estabelecidas por este meio", pontua o
advogado Daniel Orfale Giacomini, da banca Braga Nascimento e Zilio
Advogados Associados.
Tramitam no Congresso ainda diversos projetos de lei que visam à
alteração do CDC com os olhos voltados à era digital. É o caso das novas
regras previstas no PLS 281/12, que tratam da divulgação dos dados do
fornecedor, da proibição de spams, do direito de arrependimento da
compra e das penas para práticas abusivas contra o consumidor.
Nas vias informais, os consumidores também encontram grandes aliados em
busca de soluções para seus problemas. Por meio de um contato mais
próximo com outros consumidores e com as empresas, os compradores
enxergaram nas redes sociais e em sites especializados a oportunidade de
realizar pesquisas sobre os fornecedores e sua reputação.
Evite os "negócios furados"
Com tantas opções e diferentes produtos, preços praticados e lojas
on-line a dica para se evitar entrar em "furadas" é: segurar o
entusiasmo.
O desembargador aposentado do TJ/SP e professor de Direito do Consumidor
Rizzatto Nunes alerta que é preciso calma e cautela na hora de sair
clicando e gastando o valioso "dinheiro virtual".
"O consumidor, apesar de estar fazendo algum tipo de transação no meio
virtual, deve agir como se estivesse no campo real. É importante
imprimir uma cópia da oferta, do contrato, e ao decidir fazer a compra,
garantir uma via. Do ponto de vista jurídico é necessário essa
comprovação".
Aos navegantes/compradores de primeira viagem em determinado site,
Rizatto aconselha optar pelo pagamento via boleto e não usar o cartão de
credito. "Atrasa um pouco a operação, mas o risco é menor. Desta forma,
você se assegura de que não está entregando o número de seu cartão a
sistema que não conhece".
As regras tradicionais de pesquisa também são bastante válidas nesta
hora. O especialista alerta que caso o consumidor tenha dúvidas deve
realizar consultas em sites especializados em reclamações e pesquisar a
respeito da empresa. "Ele não deve jamais comprar produtos de empresa
que não tem endereço fixo ou telefone. Prevenção é fundamental. Não há
alternativa".
Fonte: Migalhas