Você
já leu os termos de uso do Facebook antes ou depois de se cadastrar? Se
a resposta for não, você faz parte dos quase 60% de internautas
brasileiros que não leem termos de uso de redes sociais. Segundo estudo
da Fecomércio SP (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do
Estado de São Paulo) feito em 2013, 60,5% dos entrevistados ignoram os
termos de uso desses sites, enquanto apenas 39,5% afirmam lê-los
integralmente.
Mas nem sempre é bom ignorar esses
textos. “Quando o usuário se cadastra em uma rede social como o
Facebook, ele está assinando um contrato. Portanto, é preciso sempre ler
atentamente os termos de uso para você ver se concorda ou não com os
artigos daquele texto”, afirma Isabela Guimarães Del Monde, advogada
especialista em direito digital do escritório Patricia Peck Pinheiro
Advogados.
No caso da rede social de Mark
Zuckerberg, o internauta é confrontado com três documentos principais: a
declaração de direitos e responsabilidades (os termos de uso
propriamente ditos), a política de uso de dados (as informações
recebidas pelo Facebook e como elas são utilizadas) e os padrões da
comunidade (o que é ou não permitido na rede social). Além disso,
existem outras páginas que complementam as regras, como parâmetros para
anúncios, páginas e promoções.
Para saber onde o usuário “está
pisando”, o Canaltech analisou, com a ajuda da advogada Isabela
Guimarães Del Monde, os principais artigos que você provavelmente não
conhecia e deveria conhecer. Confira:
“Para o conteúdo coberto pelas leis
de direitos de propriedade intelectual, como fotos e vídeo (conteúdo
IP), você nos concede especificamente a seguinte permissão, sujeita às
configurações de privacidade e aplicativos: você nos concede uma licença
mundial não exclusiva, transferível, sub licenciável, livre de
royalties, para usar qualquer conteúdo IP publicado por você ou
associado ao Facebook (Licença IP). Essa Licença IP termina quando você
exclui seu conteúdo IP ou sua conta, a menos que seu conteúdo tenha sido
compartilhado com outros e eles não o tenham excluído”(in Declaração de
direitos e responsabilidades, item 2.1).
Ao entrar no Facebook, muitos nem
fazem ideia que estão cedendo suas informações e os conteúdos que
postam. “Em poucas palavras, o artigo está dizendo que o usuário
autoriza a utilização de fotos, vídeos ou outro tipo de conteúdo
publicado em sua conta, pelo Facebook. Contudo, ele não especifica o
tipo de utilização”, explica Isabela.
“Seus amigos, e as outras pessoas
com quem você compartilha informações frequentemente, desejam
compartilhar suas informações com aplicativos para tornar suas
experiências mais personalizadas e sociais. Por exemplo, um amigo pode
querer usar um aplicativo de música que permita ver o que seus amigos
estão ouvindo. Para obter o benefício completo de tal aplicativo, seu
amigo deve fornecer a lista de amigos dele, o que inclui seu número de
identificação de usuário, para que o aplicativo saiba quais amigos
também o estão usando. Seu amigo pode também desejar compartilhar a
música que você curtiu no Facebook. Se você tornou essas informações
públicas, o aplicativo pode acessá-las como qualquer outra pessoa. Mas
se você compartilhou suas curtidas apenas com seus amigos, o aplicativo
pode pedir permissão a seu amigo para compartilhá-las”(in Política de
uso de dados, “Outros sites e aplicativos”).
Além de estar autorizando o uso de
suas informações, ao clicar em “aceito”, o usuário também está
permitindo que aplicativos tenham acesso aos seus dados. Quando o
aplicativo está em uso pelo próprio internauta, é possível controlar
quais informações o app vai usar e se ele poderá ou não publicar em sua
timeline. Porém, o caso foge das mãos do usuário quando o aplicativo
está em uso por um amigo.
“No final do ano passado, muitos
homens acharam que estavam tendo sua privacidade violada com o Lulu sem
permissão. Na verdade, se eles tivessem lido os termos de uso, veriam
que os aplicativos tinham essa permissão. Na Política de uso de dados, a
rede social diz que em alguns tipos de app, para ver o que seu amigo
está usando, jogando ou escutando, é preciso permitir que o aplicativo
tenha acesso à sua lista de conexões. Se o seu amigo permitir e você
tiver compartilhado informações públicas, como nome, idade, cidade,
etc., já está permitindo que seus dados sejam usados”, elucida a
advogada.
“Você não deve usar o Facebook se for menor de 13 anos"
Se você usa o Facebook, sabe que não
é difícil encontrar crianças com menos de 13 anos com contas na rede
social. Porém, de acordo com Isabela, esse tipo de uso não é
recomendado. “É importante que crianças abaixo dessa faixa etária não
violem essa ‘regra’ não pelos termos de uso, mas sim por conta da
segurança. Caso elas optem por criar uma conta mesmo assim, os pais
devem acompanhar sempre a atividade da criança na rede social. Mesmo
assim, ela está sujeita a ter a conta removida a qualquer momento, pois
está violando os termos”, afirma Del Monde.
“Se desativarmos sua conta, você não deverá criar outra sem nossa permissão”
De acordo com Isabela, concordar com
os termos de uso do Facebook é como “concordar com uma constituição de
um lugar que você provavelmente não quer fazer parte”. Sendo assim, você
está sempre sujeito ao julgamento da rede social e consequentemente,
caso o Facebook ache que sua conta deva ser desativada, ele fará o
mesmo. “Em casos específicos, como por exemplo, uma conta hackeada e
desativada por violar os termos de uso, o Facebook oferece ferramentas
para que o usuário ou empresa prove a invasão. Contudo, a rede social
pode aceitar ou não um pedido de reativação. Se não aceitar, cabe ação”,
explica a advogada.
“Você não deve usar o Facebook se for um criminoso sexual condenado"
Este é um dos artigos que você
provavelmente nem imaginava que poderia existir. Porém, ele não pode ser
aplicado aqui. “No Brasil, após o cumprimento integral da pena, um
condenado tem todos os direitos e deveres retomados e passa a ser
tratado como qualquer cidadão. Por isso, esse item só vale no exterior
ou para pessoas que ainda estiverem cumprindo pena por crime sexual”,
conta Del Monde.
“Você não irá intimidar,
assediar ou praticar bullying contra qualquer usuário”e“Você não
publicará conteúdo que: contenha discurso de ódio, seja ameaçador ou
pornográfico; incite violência; ou contenha nudez ou violência gráfica
ou desnecessária”
Como muitos já sabem, a internet
abre muitas portas, porém, também tem seu lado negativo. Dentro do
Facebook, isso não é diferente. Diariamente perfis, grupos e páginas
publicam textos, fotos e vídeos que ofendem outros usuários em temas
como cyberbullying, incitações ao estupro, violência ou ainda
discriminação racial, sexual e religiosa. A rede social possui
mecanismos de denúncia para evitar essas práticas, contudo, na maior
parte das vezes elas são falhas. “Se o Facebook não retirar uma
publicação que ofende uma pessoa, ela pode entrar com uma ação judicial
pedindo pela remoção. Apesar da rede afirmar que não possui
responsabilidade sobre as postagens no site, no Brasil, o Facebook tem a
obrigação de enviar informações como o IP de uma máquina quando há
violação da nossa Constituição”, afirma Isabela.
Caso o Marco Civil seja aprovado no
Senado e sancionado pela presidente, a remoção de conteúdos será
acelerada em casos de ofensa ao usuário, como o “pornô de vingança”. De
acordo com o texto do projeto, a retirada não necessitaria de ação
judicial, mas apenas de uma notificação.
“Nós podemos remover
qualquer conteúdo ou informações publicadas por você no Facebook se
julgarmos que isso viola esta declaração ou nossas políticas”
Segundo Del Monde, esse é um dos
pontos mais polêmicos dos termos de uso de Facebook. Em suma, o artigo
diz que o juízo de remoção de conteúdos é exclusivamente do Facebook, o
que acaba esbarrando em casos que não oferecem risco a ninguém, como
fotos de mães amamentando ou de nu artístico. “Geralmente o Facebook
remove a publicação e até mesmo oferece punições, como algumas horas sem
poder acessar a conta. No entanto, é possível pedir que a postagem seja
reincorporada por meio de ação”.
* Confira no final da matéria casos de pessoas que tiveram conteúdos ou perfis removidos pelo Facebook
“Você nos concede permissão para
usar seu nome, a imagem do perfil, conteúdo e informações em relação a
conteúdo comercial, patrocinado ou relacionado (como uma marca que você
gosta) fornecido ou aperfeiçoado por nós. Isto significa que, por
exemplo, você permite uma empresa ou outra entidade a nos pagar para
exibir seu nome e/ou imagem do perfil com seu conteúdo ou informações,
sem qualquer compensação a você. Se você tiver selecionado um público
específico para seu conteúdo ou informações, respeitaremos sua escolha
quando usarmos esses dados”(in Declaração de direitos e
responsabilidades, item 10.1).
“Quando você curte uma página no
Facebook, pode acabar servindo de publicidade para ela sem ser
remunerado. Assim, sua foto e nome são usados para mostrar que você
curte aquela marca na rede social. Neste caso, é possível impedir essa
utilização nas configurações de anúncio do seu perfil, contudo, poucos
sabem disso porque não leem os termos”, diz Isabela. Entretanto, existem
casos em que não há como escapar, como nas estatísticas para montar um
anúncio. Mesmo após remover seu nome e foto do banco de dados de
anúncios, o Facebook pode fornecer outras informações como idade, seus
interesses e palavras-chave de suas histórias quando os anunciantes
forem selecionar o público-alvo de um anúncio.
“A menos que façamos uma alteração
por motivos legais ou administrativos, ou para corrigir uma declaração,
ofereceremos uma notificação com sete (7) dias de antecedência (por
exemplo, publicando a alteração na Página de governança do site do
Facebook) e uma oportunidade de comentar essas alterações a esta
Declaração. Você também pode acessar nossa Página de governança do site
do Facebook e “curtir” a Página para obter atualizações sobre as
alterações a esta Declaração”(in Declaração de direitos e
responsabilidades, item 14.1).
Segundo Isabela, o Facebook tem o
costume de fazer alterações em seus termos de uso e outros documentos
sem aviso prévio. “O artigo diz que, somente em mudanças por motivos
legais ou administrativos haverá um aviso das alterações feitas. Por
isso, é sempre bom acompanhar a Página de governança do site do
Facebook, que além de anunciar mudanças, também oferece a oportunidade
dos usuários as comentarem antes mesmo delas entrarem em vigor”, conta a
advogada.
“Nós tentamos manter o Facebook
atualizado, seguro e livre de erros, mas você o usa por sua conta e
risco. Nós fornecemos o Facebook no estado em que se encontra sem
garantias expressas ou implícitas, incluindo, sem limitação, garantias
implícitas de comercialização, adequação a uma finalidade específica e
não infração. Não garantimos que o Facebook ficará sempre seguro,
protegido, sem erros, nem que o Facebook sempre funcionará sem
interrupções, atrasos ou imperfeições. O Facebook não assumirá a
responsabilidade por ações, conteúdo, informações ou dados de terceiros,
e você isenta a nós, nossos diretores, executivos, funcionários e
agentes de qualquer reclamação ou dano, conhecido e desconhecido,
decorrente ou relacionado de qualquer forma a qualquer reclamação que
você tenha contra terceiros (…)”(in Declaração de direitos e
responsabilidades, item 16.3).
Neste item, o Facebook basicamente
se isenta de qualquer falha ou dano ao usuário. Primeiro ele afirma que
não pode garantir a segurança e seu funcionamento 100% do tempo, e em
seguida, diz que nenhum funcionário da rede social poderá ser
responsabilizado por danos causados por terceiros. Porém, de acordo com
Del Monde, isso não é válido no Brasil. “No nosso país, por conta do
Código de Defesa do Consumidor e outras leis que regem o Brasil, esse
item não prescreve. Em casos de danos causados por terceiros, como
calúnia e difamação, a rede social é obrigada a cooperar com a polícia e
se preciso, entregar dados”, explica.
“Recebemos dados sobre você sempre
que você usa ou entra no Facebook, como quando você olha a linha do
tempo de outra pessoa, envia ou recebe mensagens, procura um amigo ou
uma página, clica, visualiza ou de alguma forma interage com as coisas,
usa um aplicativo móvel do Facebook, compra Créditos do Facebook ou faz
outras compras pelo Facebook”(in Política de uso de dados, “Informações
que recebemos de você).
Talvez você pense que não, mas o
Facebook vigia tudo que você faz na rede. Sabe aquela mensagem que você
digitou mas desistiu de enviar? O Facebook armazenou. E aquela “fuçada”
que você deu na timeline de um amigo? O Facebook também armazenou. Esses
dados nunca foram vazados, contudo, vale o aviso de que eles estão
sendo registrados.
Mas afinal, como fazer com que os
usuários leiam os termos de uso? Segundo Isabela, a melhor forma é usar a
mesma linguagem que eles utilizam na rede social. “O Facebook poderia
explicar melhor os principais itens com fotos, vídeos e, principalmente,
tornar a linguagem dos termos mais simples. Para um advogado que
trabalha com isso, parece simples, mas para um leigo, nem sempre é
possível entender o que o texto quer dizer”, afirma.
Para quem não quer ler todos os
termos de uso do Facebook e de outras redes sociais, existem algumas
ferramentas que podem facilitar o seu entendimento. Uma delas é oToS;DR
ou “Terms of Service; Didn’t Read” (em inglês, “Termos de Serviço; Não
Li”). Trata-se de um site que resume os principais pontos dos termos de
uso dos sites e com base neles, os classifica por confiança. Além disso,
a plataforma é colaborativa, o que permite que todos incluam artigos
que merecem atenção.