Ex-senador é preso por corrupção. E o dinheiro?
Publicado por Luiz Flávio Gomes -
A história do Brasil (também da América Latina e da África – veja Manoel Bomfim, A América Latina)
constitui um dos relatos de enorme superação dos povos cruelmente
colonizados; Ao mesmo tempo, coloridos por fatos deprimentes e
desabonadores, tisnados de sangue e de roubalheira generalizada. Nesta
magnífica terra de palmeiras, onde canta o sabiá, “tudo que é nego
torto, do mangue ao cais do porto” (Chico Buarque), já foi inoculado com
o vírus da corrupção (na Colônia, no Império, na República, nas
ditaduras e nas democracias).
O ex-senador Luiz Estevão, que
acaba de ser preso (em set/14), começou a trabalhar cedo e rapidamente
fez fortuna na agropecuária, construção civil, revenda de automóveis e
pneus, estação de rádio, banco de investimentos. Tornou-se um grande
empresário (Grupo OK) e, ao mesmo tempo, conforme reconheceu a Justiça,
um “barão ladrão”. Foi fiador do “empréstimo” (mais que suspeito) de US$
5 milhões para Collor (Operação Uruguai).
Foi deputado e
depois senador (como político, concedeu-se nova licença para roubar).
Envolveu-se com o juiz Nicolau dos Santos Neto no desvio das verbas
públicas do TRT-São Paulo (prejuízo de mais de R$ 1 bilhão aos cofres
públicos). Foi cassado pelo Senado. Prometeu devolver para a União R$
468 milhões.
Tem mais de 30 anos de prisão para cumprir
(somando-se duas condenações, uma ainda sem trânsito em julgado). O
escândalo é do princípio dos anos 90. Veio à tona em 1998 e até hoje
(depois de 20 anos) ainda não está resolvido pela Justiça brasileira
(maldita morosidade!). A cultura ocidental inventou o capitalismo, a
ciência e o Estado de Direito (M. Weber). No sistema capitalista
selvagem (que não tem nada a ver com o capitalismo distributivo da
Escandinávia, por exemplo, que eu admiro), tudo é instrumentalizado em
função da roubalheira das elites poderosas imorais.
O Estado de
Direito, na verdade o Estado e o Direito, no capitalismo selvagem, não
são nada sagrados. São impuros e corrompidos pelos donos do poder. Tudo
isso necessita de profundas reformas. O capitalismo no Brasil,
diferentemente do que ocorre na Escandinávia (por exemplo),
transformou-se em mero instrumento de dominação, das classes
hegemônicas. É usado para promover o progresso, mas concomitantemente
para o mal, para garantir a impunidade dos detentores “da ordem” (altos
funcionários, políticos e agentes econômicos/financeiros).
Nos países de capitalismo civilizado, o Estado de Direito é costumeiramente usado para o bem (veja Mattei/Nader, Pilhagem).
Mas isso não é a regra. É exceção. A investigação de uma roubalheira (e
punição) de um ex-senador constitui (no Brasil) uma suada vitória da
corrente contra-hegemônica. A morosidade da Justiça, no entanto, retrata
o normal uso do Direito e das instituições jurídicas para favorecer o
capitalista selvagem, o bandoleiro, o corruptor e o corrupto.
O
mal uso do Estado de Direito projeta a impunidade. Quando esta não
acontece (em raros casos), preserva-se ao menos a riqueza ilícita nas
mãos dos bandalheiros. A forma corrente de se alcançar esse indecente
resultado consiste em a Justiça jogar todas as energias na pena de
prisão (que satisfaz o desejo da patuleia), deixando a riqueza intacta
ou não devidamente sancionada (com, pelo menos, o dobro do proveito
ilícito obtido).
É dessa forma que o Titanic chamado Brasil vai
se afundando. Necessitamos de reformas profundas. Frente ao criminoso do
colarinho branco não podemos deixar barato: devolução de, no mínimo, o
dobro do proveito obtido ilicitamente.
FONTE: JUS BRASIL
FONTE: JUS BRASIL