DOMÉSTICAS - O QUE FALTOU DIZER
09 de abril de 2013 |
Se a sua empregada doméstica precisar
fazer uma hora extra, lembre-se de que ela terá de descansar 15 minutos antes
de começar.
Se você precisa de muitas horas
extras, atente que ela não pode exceder dez horas por semana.
Se dorme ou não no emprego, ela terá
de ficar 11 horas sem trabalhar depois de encerrada uma jornada.
Atenção: ela não pode comer em menos
de uma hora em cada refeição.
Se ela demorar mais de dez minutos
para entrar no serviço, trocar de roupa ou tomar banho na hora da saída, esse
tempo será contado como hora extra.
Se ela dorme no quarto com uma
criança ou um doente, terá de ser remunerada com adicional noturno e
eventualmente hora extra por estar à disposição daquela pessoa.
Se você tiver de compensar em outro
dia as horas a mais que ela trabalhou no dia anterior (banco de horas),
lembre-se de que isso tem de ser previamente negociado com o sindicato das
domésticas.
Se você concede à sua empregada um
plano de saúde e ela se acidentar e for aposentada por invalidez, o plano terá
de ser mantido pelo resto da vida.
Se, para melhor controle do seu
desempenho, você estabelecer metas e tarefas diárias que sua empregada
considere exageradas, ela pode processá-lo por danos morais.
E se você não pagar a indenização que
o juiz determinar, ele penhorará (online) o saldo da sua conta bancária - sem
prévio aviso.
Tudo isso está na lei e na jurisprudência. E há muito mais. Para ser franco, o
espaço todo deste jornal não seria suficiente para explicar as complicações
decorrentes dos 922 artigos da CLT e dos milhares de normas administrativas e
orientações dos tribunais.
Por isso vou parar por aqui, mesmo
porque não quero ser considerado catastrofista. Nem por isso, porém, posso
concordar com a opinião da nobre desembargadora Ivani Bramante, publicada neste
caderno (2/4), segundo a qual os patrões estão com paranoia (sic) em relação à
nova lei das domésticas.
O fato é que, no País inteiro, não se fala noutra coisa. A apreensão é geral.
Os políticos já perceberam o desconforto e a irritação causados pelo impensado
ato.
Muitos já reformulam o seu cálculo
eleitoral: se ganharam a simpatia das empregadas, perderam o apoio dos milhões
de eleitores que não podem prescindir dos serviços de uma babá ou de um
cuidador de idoso. A esse grupo se juntarão as empregadas que serão
dispensadas.
Convenhamos, a execução do atual
cipoal trabalhista já é difícil nas empresas. O que dizer das famílias, que não
dispõem de contador, departamento de pessoal e assessoria jurídica? A nova lei,
além de encarecer os serviços (que já estão caros), vai mudar o relacionamento
entre empregada e empregador, que, de confiável e amistoso, passará a
burocrático e conflituoso.
Os políticos buscam agora colocar uma
tranca na porta que acabaram de arrombar. Mas as emendas poderão sair pior do
que os sonetos. E podem ser inúteis, pois, a esta altura, as famílias que podem
já se puseram a desenhar a sua vida sem a ajuda das empregadas domésticas.
A questão do encarecimento também é séria. O meu amigo Osmani Teixeira de
Abreu, conhecedor profundo das relações do trabalho no Brasil, acredita que, em
médio prazo, vai sobrar empregada doméstica, porque muitos empregadores não
terão condições de cumprir a nova lei. Ele argumenta que na empresa, quando há
um aumento de custo, o empresário o repassa ao preço ou o retira do lucro. O
empregador doméstico não tem como fazer isso, porque geralmente é empregado e
vive de salário, que não é elástico.
Ou seja, na pretensão de melhorar a vida das empregadas domésticas, nossos
legisladores deixaram de lado o que é mais prioritário no momento presente, que
é a formalização dos 5 milhões de brasileiras que não contam sequer com as
proteções atuais. Será que aumentando os direitos e criando tanta insegurança
elas vão ser protegidas? Penso que não. Muitas serão forçadas a trabalhar como
diaristas, sem registro em carteira.
* José Pastore é
professor de Relações do Trabalho da FEA-USP e membro da Academia Brasileira de
Letras.