Igreja é condenada a indenizar vítima de padre pedófilo
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A
Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a
Igreja Católica deve ser responsabilizada civilmente, de maneira
solidária e objetiva, pelos danos advindos de delito cometido por algum
de seus padres.
No recurso especial que envolveu a Mitra
Diocesana de Umuarama (PR) e padre que cometeu crimes sexuais contra
menor, o colegiado também discutiu o prazo prescricional para
ajuizamento de ação reparatória de danos morais pela vítima, quando a
ação penal é proposta pelo Ministério Público dentro do prazo de três
anos.
A vítima ajuizou ação de compensação por danos morais
contra a mitra e o padre, que havia confessado o crime no processo
penal. A sentença reconheceu o ato ilícito do padre, que ofendeu a
integridade moral do menor, e condenou tanto ele quanto a mitra a pagar
indenização no valor de R$ 100 mil, metade para cada um, de forma
solidária.
O Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) negou
provimento às apelações, reconhecendo a responsabilidade solidária da
igreja, já que o padre era subordinado a ela.
Em recurso ao STJ, a mitra alegou ofensa a dispositivos do Código Civil, do Código de Processo Civil e do Decreto 7.107/10, que promulgou acordo entre o governo brasileiro e a Santa Sé para adoção do Estatuto Jurídico da Igreja Católica no Brasil.
A
entidade eclesiástica sustentou que não haveria responsabilidade
solidária e objetiva de sua parte, visto que a autoria do delito era de
terceiro. Alegou ainda que a pretensão da vítima, de reparação na esfera
civil por danos morais, estaria prescrita, pois a ação teria sido
ajuizada mais de três anos após os fatos.
Preposição
A
ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso, lembrou que a própria
mitra afirmou que o padre acusado desenvolvia trabalho voluntário e
vocacional de ordem religiosa, vinculado à entidade, cumprindo funções,
horários e normas da administração da paróquia. Esse fato é suficiente
para configurar a relação de preposição, nos termos do artigo 932 do Código Civil de 2002 (CC/02), pois, conforme prega a doutrina, a preposição tem por essência a subordinação afirmou a ministra.
Segundo
Nancy Andrighi, o STJ ampliou o conceito de preposição há muito tempo,
para além das relações empregatícias, ao decidir que não é preciso que
exista um contrato típico de trabalho, sendo suficiente a relação de
dependência ou que alguém preste serviço sob o interesse e o comando de
outrem (REsp 304.673).
A regra, conforme mencionou a ministra, é a
responsabilidade civil individual, porém, existem situações em que o
ordenamento jurídico atribui a alguém, independentemente de culpa sua, a
responsabilidade solidária por ato de outrem, considerando, para tanto,
determinada relação jurídica havida entre eles (artigos 932 e 933 do CC/02).
A
relatora alertou que mais do que uma simples relação de subordinação, o
ministro ordenado é para os fiéis a própria personificação da Igreja
Católica, no qual, em razão do desempenho de tão importante papel,
depositam justas expectativas de retidão moral e santidade.
Nesse
contexto, acrescentou, mostra-se ainda mais reprovável o comportamento
do réu, que, sob o manto do sacerdócio e aproveitando-se dele, abusando,
pois, da lídima crença que lhe era devotada em razão de sua qualidade
de padre, convencia as vítimas menores a pernoitar na casa paroquial em
sua companhia, para praticar atos libidinosos.
Por isso, segundo a
ministra, é necessário que se lance um olhar mais crítico e realista
acerca da relação havida entre as instituições eclesiásticas e seus
servidores. A igreja não pode ser indiferente em especial no plano da
responsabilidade civil, frise-se aos atos praticados por quem age em seu
nome ou em proveito da função religiosa que se lhe atribui, sob pena de
trair a confiança que nela própria depositam os fiéis.
Prescrição
A relatora explicou que, no âmbito civil, aquele que por ato ilícito causa dano a outrem tem o dever de repará-lo (artigo 927 do CC/02). E no âmbito penal, um dos efeitos da condenação é tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime (artigo 91, I, do Código Penal).
Dessa
forma, quem pretende ser ressarcido dos danos sofridos com a prática do
delito pode escolher, de duas, uma: ajuizar a correspondente ação
reparatória ou aguardar o desfecho da ação penal, para, então, executar
ou liquidar o título constituído, conforme o caso.
De acordo com
Nancy Andrighi, no momento em que toma conhecimento do autor do crime,
nasce para o ofendido a pretensão de exigir reparação, que se extingue
no prazo de três anos, em tese. Mas se, nesse período, for iniciado
procedimento criminal para apuração do mesmo fato, a prescrição fica
suspensa até a sentença penal definitiva. Nesse sentido, a relatora
citou precedentes do STJ como o AgRg no AREsp 268.847, de relatoria
própria, e o REsp 665.783, do ministro Aldir Passarinho Junior.
Por
isso, continuou a ministra, se o procedimento criminal não for iniciado
no lapso temporal de três anos, não há falar em suspensão da prescrição
da pretensão reparatória no juízo cível, de modo que, nesse caso, a
inércia da parte em propor a ação de conhecimento naquele prazo será
punida com a extinção da pretensão, restando-lhe apenas a possibilidade
de executar a sentença definitivamente proferida pelo juízo criminal.
No
caso julgado, conforme ressaltou a ministra, não houve prescrição na
área civil, porque o crime havia sido cometido em 2002 e a denúncia
oferecida pelo Ministério Público ao juízo criminal foi recebida em 2004
dentro, portanto, dos três anos, o que levou à suspensão do prazo
prescricional.
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