A IMPENHORABILIDADE SOBRE
VALORES DEPOSITADOS EM CADERNETA DE POUPANÇA.
Publicado em 09/2014. Elaborado em 03/2014.
Os valores depositados em caderneta de poupança até a quantia de 40
salários mínimos são considerados impenhoráveis. Entretanto, parte da doutrina
e jurisprudência vem considerando essa proteção exacerbada, causando prejuízos
aos credores.
O inciso X do artigo 649 assegura a
impenhorabilidade sobre as quantias depositadas em caderneta de poupança, até o
limite de 40 (quarenta) salários mínimos.
Deve-se atentar que o legislador fez questão
de nominar o tipo de investimento protegido, a caderneta de poupança; portanto,
os outros tipos de benefícios não devem ser estendidos a outros tipos de
investimentos.
Essa proteção prevista na lei processual, nas
palavras do professor Araken de Assis (2009. p.248) demonstrou “elogiável
sensibilidade com as poupanças modestas, formadas ao longo de anos de trabalho
árduo e honesto e que representam o capital de toda uma vida”, sendo pertinente
restringir a penhorabilidade a este tipo de investimento historicamente
popular.
Outro ponto a se destacar é que a regra de
impenhorabilidade abrange o limite de 40 (quarenta) salários mínimos aplicados
pelo executado, independentemente da quantidade de aplicações realizadas, mesmo
que em diferentes instituições bancárias, pois se assim não fosse, o sistema
seria facilmente burlado, com a aplicação de quantia superior a 40 (quarenta)
salários mínimos em várias cadernetas de poupança.
A proteção da impenhorabilidade deve ser
aplicada sobre a soma total dos valores depositados, assim, mesmo que o
executado tenha aplicado valor menor que 40 (quarenta) salários mínimos em
várias cadernetas de poupança, todo o valor global será considerado
impenhorável.
E da seguinte forma se posiciona o STJ:
“RECURSO ESPECIAL Nº 1.231.123 - SP
(2011/0003344-6)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
PROCESSO CIVIL. IMPENHORABILIDADE DE
DEPÓSITOS EM CADERNETA DE POUPANÇA. EXISTÊNCIA DE MAIS DE UMA APLICAÇÃO.
EXTENSÃO DA IMPENHORABILIDADE A TODAS ELAS, ATÉ O LIMITE DE 40 SALÁRIOS MÍNIMOS
FIXADO EM LEI.
1. O objetivo do novo sistema de
impenhorabilidade de depósito em caderneta de poupança é, claramente, o de
garantir um mínimo existencial ao devedor, como corolário do princípio da
dignidade da pessoa humana. Se o legislador estabeleceu um valor determinado
como expressão desse mínimo existencial, a proteção da impenhorabilidade deve
atingir todo esse valor, independentemente do número de contas-poupança
mantidas pelo devedor.
2. Não se desconhecem as críticas, "de
lege ferenda", à postura tomada pelo legislador, de proteger um devedor
que, em lugar de pagar suas dívidas, acumula capital em uma reserva financeira.
Também não se desconsidera o fato de que tal norma possivelmente incentivaria
os devedores a, em lugar de pagar o que devem, depositar o respectivo valor em
caderneta de poupança para burlar o pagamento.
Todavia, situações específicas, em que reste
demonstrada postura de má-fé, podem comportar soluções também específicas, para
coibição desse comportamento. Ausente a demonstração de má-fé, a
impenhorabilidade deve ser determinada.
3. Recurso especial conhecido e provido.”
Conforme o entendimento da Ministra Nancy
Andrighi, no julgado supracitado, a impenhorabilidade dos valores depositados
em caderneta de poupança tem como objetivo garantir o mínimo existencial ao
devedor, promovendo o princípio da dignidade da pessoa humana, disposto na CF,
para que o executado possa contar com um numerário mínimo que lhe garanta uma
subsistência digna.
Há muitas críticas na doutrina sobre o fato
do legislador ter optado por proteger os valores depositados em caderneta de
poupança do executado em lugar de utilizá-los para pagar os credores, pois se
presume que o devedor que tem a possibilidade de realizar investimentos, não
esteja em situação de não possuir o mínimo para subsistência de sua família, no
entendimento adotado pelo festejado escritor Cândido Rangel Dinamarco (2007)
considerar “impenhoráveis esses bens, de forma absoluta, salvo para fins de
prestação alimentícia, é permitir enriquecimento ilícito do devedor e o
correspondente empobrecimento do credor”.
Mas diante da letra cristalina da lei, o
posicionamento apresentado trata-se de uma corrente minoritária, conforme
explica a Ministra Nancy Andrighi:
RECURSO ESPECIAL Nº 1.231.123 - SP
(2011/0003344-6)
“PROCESSO CIVIL. IMPENHORABILIDADE DE
DEPÓSITOS EM CADERNETA DE POUPANÇA. EXISTÊNCIA DE MAIS DE UMA APLICAÇÃO.
EXTENSÃO DA IMPENHORABILIDADE A TODAS ELAS, ATÉ O LIMITE DE 40 SALÁRIOS MÍNIMOS
FIXADO EM LEI.
[...] Não se desconhece as críticas, "de lege ferenda", à
postura tomada pelo legislador, de proteger um devedor que, em lugar de pagar
suas dívidas, acumula capital em uma reserva financeira. Também não se
desconsidera o fato de que tal norma possivelmente incentivaria os devedores a,
em lugar de pagar o que devem, depositar o respectivo valor em caderneta de
poupança para burlar o pagamento. Todavia, situações específicas, em que reste
demonstrada postura de má-fé, podem comportar soluções também específicas, para
coibição desse comportamento. Nas hipóteses em que a má-fé não esteja
demonstrada, contudo - como ocorre nos autos - não resta ao judiciário outra
alternativa senão a da aplicação da Lei.”
Como se observa o legislador realmente optou
por garantir ao devedor o mínimo para a preservação de sua dignidade em face da
pretensão do exequente, mas diante do perigoso instrumento que se tornou a
conta poupança, devido a atitude de devedores mal intencionados, que em busca
da proteção da impenhorabilidade, transferem todos os seus recursos de forma
fraudulenta para esse tipo de investimento, boa parte da doutrina e
jurisprudência tem-se posicionado no sentido de que apenas as quantias que
tenham sido depositadas na caderneta de poupança antes do momento do
inadimplemento da obrigação assumida estão acobertadas pelo manto da
impenhorabilidade.
Desta forma, esse posicionamento precavido
busca inibir os atos fraudulentos do executado, conforme explica os professores
Bruno Garcia Redondo e Mário Vitor Suarez Lojo (2007. p.117):
“Para que a proteção legal de impenhorabilidade de caderneta de poupança
não se transforme em incentivo ao inadimplemento, devem-se considerar como
impenhoráveis apenas as quantias que tenham sido depositadas na caderneta antes
do momento da constituição da obrigação inadimplida. Ou seja, é necessário que
o magistrado verifique a data dos depósitos na caderneta, para que sejam
impenhoráveis apenas os valores depositados antes obrigação inadimplida ter
sido contraída. Caso contrário, bastaria ao executado, em ato fraudulento,
transferir recursos de sua conta-corrente pra uma conta de poupança e, com
isso, livrar da iminência da penhora uma quantia de até 40 salários mínimos que
estivesse depositada em sua conta-corrente, o que não pode ser admitido.”
A jurisprudência também já se manifestou
neste sentido:
“Processo 4000436-42.2013.8.26.0451 - Execução de Título Extrajudicial -
Contratos Bancários - Banco do Brasil S/A - MAGNA - ASSESSORIA E COLSULTORIA DE
QUALIDADE LTDA - - MARIA TEREZA ZAMPIERI - - RODRIGO CASTELLOTTI BARBOSA -
Vistos. Fls. 113/116: 1. É cediço que o art. 649, X, do Código
de Processo Civil foi elaborado para proteger os cidadãos de baixa renda
que tenham conseguido amealhar uma reserva monetária de até 40 (quarenta) salários
mínimos e que a tenham colocado no mais popular dos investimentos: a poupança.
Para evitar que o mencionado artigo seja usado maliciosamente por pequenos
devedores, que poderiam transferir suas reservas monetárias para conta poupança
após o início da execução, tornando-as intangíveis para o feito executivo, a
doutrina tem sustentado que a impenhorabilidade da conta poupança exige que
tenha sido aberta antes do surgimento do crédito executado. Nesse sentido:
“deve ser considerada impenhorável a quantia existente em caderneta de poupança
antes do momento da constituição da obrigação inadimplida” (Curso de
Direito Processual Civil Execução Fredie Didier Jr. e outros 1ª ed. ed. Jus
Podivm, 2009, v.5, p. 565). Se assim não o fosse, estaria instituída “carta
branca” para a fraude, eis que a mera transferência de valores pelo devedor, de
sua conta-corrente para uma conta-poupança, bastaria para livrar-se da
iminência de uma penhora no montante de até 40 (quarenta) salários mínimos.
Diante disso, concedo à executada prazo de 5 (cinco) dias para que comprove a
data de abertura de sua conta poupança, sob pena de manutenção da constrição.
2. Comprovado pela executada que o valor bloqueado e transferido de sua conta
corrente possui natureza alimentar e, portanto, é impenhorável nos termos do
artigo 649, IV, do CPC (fls. 118/120), defiro o
levantamento de referida quantia (R$ 2.186,04), expedindo-se MLJ.”
Portanto, depósitos realizados em
conta poupança do executado posteriormente a constituição da obrigação inadimplida,
caracterizam atos fraudulentos, e obviamente não podem ter a proteção da lei.
Ressalta-se ainda que, imbuídos
de má-fé, muitos devedores utilizam-se do depósito de seus valores em conta
poupança para se esquivarem do adimplemento de sua obrigação, ludibriando o
sistema e a finalidade protetiva que o legislador pretendeu ao salvaguardar a
poupança, como forma de dar especial atenção a esse investimento popular e aos
pequenos poupadores.
A utilização da conta poupança com a
realização de constantes depósitos, saques e pagamentos de contas corriqueiras,
com nítido caráter circulatório, desvirtua a sua finalidade para uma verdadeira
conta corrente, fato que enseja a constrição do numerário nela existente.
Sobre o tema, confira-se o julgado do
Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios:
(20070020132022AGI, Relator MARIA BEATRIZ
PARRILHA, 4ª Turma Cível, julgado em 19/12/2007, DJ 10/01/2008 p. 1150)
“DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. PENHORA
ON LINE. DESBLOQUEIO DE VALORES EM POUPANÇA. IMPOSSIBILIDADE. DESVIRTUAMENTO EM
CONTA-CORRENTE. CABIMENTO. PENHORA DE LIMITE DE VALOR DA CONTA-SALÁRIO.
MITIGAÇÃO DA REGRA DA IMPENHORABILIDADE.
01. O desbloqueio de penhora on-line efetuada
via BACEN/JUD sobre conta-poupança de devedor somente pode ser autorizado
quando não houver indícios de desvirtuamento da mesma como conta-corrente, utilizada
para movimentação financeira.
02. A jurisprudência, assim como a doutrina,
vem mitigando a impenhorabilidade de valores em conta-salário, permitindo-se a
penhora de parte do numerário, quando não forem localizados outros bens
passíveis de constrição.
03. Agravo de Instrumento parcialmente provido.”
Portanto, valores depositados em conta
poupança caracterizada como conta-corrente são passíveis de penhora para
satisfação do crédito exequente.
Autor
FONTE: JUS NAVIGANDI
Como citar este
texto (NBR 6023:2002 ABNT)
ASSIS, Miguel Mendonça de. Caderneta de poupança e
impenhorabilidade. Revista
Jus Navigandi, Teresina, ano 20, n. 4284, 25 mar. 2015. Disponível em: .
Acesso em: 27 mar. 2015.
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