Prejuízo ao erário
Desembargador do TJ-RS critica ‘‘indústria de honorários’’ ao indeferir ação.
Se
o consumidor não está identificado de forma segura na petição inicial,
não prova que tenha tentado solucionar seu problema ou solicitado,
administrativamente, cópia do contrato com a empresa que lhe forneceu
produtos e serviços insatisfatórios, sua ação exibitória de documentos
deve ser julgada improcedente. O entendimento é da 20ª Câmara Cível do
Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, ao indeferir ação cautelar exibitória de uma mulher contra uma rede de farmácias.
A
autora ajuizou a ação para obter cópia do contrato celebrado no valor
de R$ 50,44 — que não foi pago, resultando na inscrição do seu nome em
cadastros de restrição de crédito. No primeiro grau, o juiz simplesmente
extinguiu o feito, sem resolução de mérito, arguindo falta de
‘‘interesse de agir’’.
Já o relator do caso no TJ-RS,
desembargador Dilso Domingos Pereira, foi mais fundo ao analisar a
questão. ‘‘Observa-se, de plano, que a requerente não esclarece a
espécie de contrato entabulado com o réu, tampouco as supostas
irregularidades presentes no instrumento. A causa de pedir,
genericamente exposta, omite — acredita-se, de forma proposital —
qualquer detalhe do caso concreto, muito provavelmente com o fito de
evitar eventual arguição e condenação às penas por litigância de
má-fé’’, escreveu em seu voto.
Ele explicou, inicialmente, que a
jurisprudência assentada no Superior Tribunal de Justiça sinaliza que o
consumidor possui, irrestritamente, o ‘‘interesse de agir’’ em ações
exibitórias de documentos, independentemente de solicitação idêntica na
via administrativa.
A fundamentação é que a exibitória pode ter caráter
satisfativo, se esgotando em si mesma; ou sirva para resguardar um
direito que possa ser buscado, afastando o risco de instrução deficiente
da futura demanda — o que geralmente ocorre nestes casos.
Crítica à ‘‘indústria de honorários’’
O problema é que esta ‘‘facilidade’’, facultada pela jurisprudência, acabou sendo capitalizada por advogados antiéticos, afirma o desembargador. Aproveitando-se da tutela demasiado abrangente, segundo o relator, os profissionais passaram a ajuizar ações cautelares massificadas, de forma desenfreada, com o único objetivo de angariar honorários advocatícios. ‘‘Os clientes, muitas das vezes recrutados nas ruas, sequer são sabedores da propositura de inúmeras demandas em seu nome. Outorgam procuração em razão das promessas de ‘dinheiro fácil’ e, ato contínuo, passam a integrar o polo ativo de incontáveis ações manifestamente improcedentes, gerando, para seus mandatários, renda garantida’’, constatou.
O problema é que esta ‘‘facilidade’’, facultada pela jurisprudência, acabou sendo capitalizada por advogados antiéticos, afirma o desembargador. Aproveitando-se da tutela demasiado abrangente, segundo o relator, os profissionais passaram a ajuizar ações cautelares massificadas, de forma desenfreada, com o único objetivo de angariar honorários advocatícios. ‘‘Os clientes, muitas das vezes recrutados nas ruas, sequer são sabedores da propositura de inúmeras demandas em seu nome. Outorgam procuração em razão das promessas de ‘dinheiro fácil’ e, ato contínuo, passam a integrar o polo ativo de incontáveis ações manifestamente improcedentes, gerando, para seus mandatários, renda garantida’’, constatou.
Pereira ainda chamou a atenção para a
‘‘coincidência de identidades’’ entre os problemas enfrentados pelos
clientes de determinados advogados — preservando, porém, os seus nomes.
‘‘Enquanto todos os constituintes do advogado ‘A’ nunca são notificados
previamente à sua inscrição junto aos órgãos creditícios, todos os
clientes do advogado ‘B’ necessitam os contratos bancários (que não
sabem se firmaram ou não), com o fito de ‘analisar a viabilidade de
ajuizar ação revisional’, sendo os outorgantes do advogado ‘C’
constantemente surpreendidos com a negativação de seu nome por dívidas
que jamais contraíram’’, denunciou.
A distorção, segundo o
desembargador Pereira, vem causando prejuízos não apenas aos
particulares, que se vêem compelidos a criar fundos para lidar com a
sucumbência nesta espécie de demanda, como ao próprio Poder Judiciário. É
que a maior parte das ações exibitórias é ajuizada por pessoas que
litigam sob o benefício da assistência judiciária gratuita (AJG) .
‘‘Assim,
ao se permitir que aqueles que não arcam com as custas processuais, e
valendo-se desta prerrogativa, proponham indiscriminadamente demandas
infundadas, está-se onerando o próprio erário e incorrendo em grave
violação à preponderância do interesse público sobre o privado
(Princípio da Supremacia do Interesse Público), mas o mais grave é o
abarrotamento do Judiciário com demandas totalmente infundadas’’,
concluiu. O acórdão foi lavrado na sessão de julgamento do dia 3 de
dezembro.
Clique aqui para ler a sentença.
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