Asilo inviolável
Permissão de acusado não autoriza polícia a fazer busca e apreensão.
A
polícia só pode fazer busca e apreensão em residências com mandado
judicial. A regra não pode ser quebrada nem mesmo se o dono da casa
autorizar a entrada dos oficiais, pois não existe previsão
constitucional que ampare busca policial em domicílio feita com a
permissão apenas do investigado. O argumento levou a 3ª Câmara Criminal
do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul a derrubar a condenação
de um detento flagrado, durante o trabalho externo, na posse de drogas.
Após ser abordado, ele levou os policiais até sua casa, onde foi
encontrada mais cocaína. Para o tribunal, o consentimento se deu sob flagrante constrangimento.
O
relator das Apelações, desembargador Diógenes Hassan Ribeiro, disse que
o consentimento para entrar na residência — como se refere o artigo
5º, inciso XI, da Constituição — não autoriza buscas sem determinação
judicial. Caso contrário, os Mandados de Busca e Apreensão seria
dispensáveis, já que a polícia poderia conseguir, extrajudicialmente, o
"consentimento" do proprietário.
"Ora, se a Constituição
estabelece que a casa é asilo inviolável, isso significa dizer que
apenas e tão-somente em estrita observância dos casos previstos em lei é
que se pode proceder ao ingresso na residência alheia. Entre tais
hipóteses, a mera suspeita de prática de ilícito criminal não é apta a
relativizar o direito fundamental à inviolabilidade de domicílio",
escreveu no acórdão.
Embora a droga e os objetos apreendidos na
casa do acusado estejam "contaminados" pela ilegalidade, ressaltou o
relator, tal não anula o processo, pois a busca pessoal foi revestida de
legalidade, face às fundadas suspeitas de envolvimento com drogas. No
entanto, frisou, não é possível manter uma condenação por tráfico apenas
com base na palavra dos policiais, na ausência de outros elementos de
prova.
"É verdade, e isso fica confirmado, que no Brasil se
investiga de menos — e mal — e se acusa demais — e mal —, crendo que o
Poder Judiciário, o guardião das liberdades, que detém — ou deve deter —
o atributo da imparcialidade, deva se compadecer com acusações de fatos
graves que não apresentam prova clara, esclarecedora, definitiva, da
versão acusatória.
No caso dos autos, impunha-se maior e melhor
investigação", afirmou. O acórdão foi lavrado na sessão de 15 de maio.
A denúncia
Um casal de detentos do regime semiaberto, em regime de trabalho externo, foi acusado pela polícia de comercializar drogas perto de um hospital e de ginásios de esportes. A atividade do casal, que trabalhava em serviços de limpeza e manutenção na prefeitura de Vacaria, na Serra gaúcha, gerou várias denúncias à policia.
Um casal de detentos do regime semiaberto, em regime de trabalho externo, foi acusado pela polícia de comercializar drogas perto de um hospital e de ginásios de esportes. A atividade do casal, que trabalhava em serviços de limpeza e manutenção na prefeitura de Vacaria, na Serra gaúcha, gerou várias denúncias à policia.
Em abordagem em junho de 2013, os policiais encarregados da investigação encontraram cinco volume de cocaína na
roupa do acusado. Após a apreensão, ele e a mulher foram levados à sua
residência, onde a polícia efetuou novas buscas. O laudo registrou que
foram encontradas no local outras 250 gramas de cocaína. A prisão em
flagrante foi convertida em prisão preventiva, que acabou derrubada pela
concessão de Habeas Corpus.
Com base no inquérito
policial, o casal foi denunciado pelo Ministério Público estadual como
incurso nas sanções dos artigos 33, caput, e 35, ambos da Lei
11.343/06, combinado com o artigo 40, incisos III e VI, da mesma Lei,
na forma do artigo 69 e 29 e 61, inciso I — todos do Código Penal. Em
síntese: se associar para promover a venda de drogas em locais de grande
circulação, como ginásios, visando jovens e adolescentes.
Em
alegações escritas entregues durante a fase de instrução, o MP
reformulou a denúncia. Requereu a condenação do réu às sanções do artigo
33, combinado com o artigo 40, inciso III, da Lei 11.343/06, e artigo
61, inciso I, do Código Penal. Ou seja, vender droga nestes locais, de
forma reincidente. O MP também pediu a absolvição da mulher do acusado,
por falta de provas, como dispõe o artigo 386, inciso VII, do Código de
Processo Penal.
A defesa, preliminarmente, afirmou que a abordagem
foi ilegal e que não houve ordem judicial que autorizasse o ingresso
dos policiais na residência dos réus. Assim, em razão da prisão estar em
desconformidade com os requisitos legais, se faz presente a teoria dos
‘‘frutos da árvore envenenada’’, o que contamina todo o material
probatório.
No mérito, afirmou que não há provas de que o réu
traficava, sendo o depoimento dos policiais insuficiente para embasar
uma condenação. Pediu a absolvição do réu por falta de provas ou,
subsidiariamente, a desclassificação do delito para o de uso de drogas.
A sentença
A juíza de Direito Anelise Boeira Varaschin Mariano da Rocha, da 2ª Vara Criminal da Comarca de Vacaria, afirmou, na sentença, que o tráfico de drogas é crime permanente, que não exige prévio Mandado de Busca e Apreensão para ingresso em residência. A permissão vem expressa nos termos do artigo 5º., inciso XI, da Constituição. O dispositivo diz que ninguém pode entrar na residência sem consentimento do morador, em função do seu caráter inviolável, "salvo em caso de flagrante delito ou desastre".
A juíza de Direito Anelise Boeira Varaschin Mariano da Rocha, da 2ª Vara Criminal da Comarca de Vacaria, afirmou, na sentença, que o tráfico de drogas é crime permanente, que não exige prévio Mandado de Busca e Apreensão para ingresso em residência. A permissão vem expressa nos termos do artigo 5º., inciso XI, da Constituição. O dispositivo diz que ninguém pode entrar na residência sem consentimento do morador, em função do seu caráter inviolável, "salvo em caso de flagrante delito ou desastre".
Além disso, flagrado de posse da droga, o próprio
acusado franqueou a residência do casal para que os policiais fizessem
busca e levantamento. Logo, emendou, no tocante a este aspecto, não se
poderia falar em ilegalidade.
Com relação ao mérito, a juíza, com
base nos autos e em depoimentos, se convenceu de que não existiam provas
para condenar a mulher do réu. Este, ao contrário, mantinha em
depósito e vendia cocaína. O próprio relatório da investigação —
destacou — indica que os usuários chegavam de carro no ginásio para
contatá-lo, saindo logo em seguida.
Ao fim e ao cabo, a julgadora
condenou o réu à pena de cinco anos e seis meses de reclusão, em regime
inicial fechado, e ao pagamento de 500 dias-multa, à razão mínima legal.
A sentença ainda decretou a perda de pequenos valores em dinheiro,
celulares e o automóvel Santana, de propriedade do filho do réu, usado
no comércio de drogas.
Acusação e defesa entraram com Apelação no
TJ-RS. A primeira, pedindo aumento de pena, em função do comércio da
droga ter se realizado perto de ginásios e hospitais, como dispõe o
artigo 40, inciso III, da Lei 11.343/06. A segunda, arguindo preliminar
de nulidade em razão do ingresso ilegal dos policiais na casa do
acusado.
Clique aqui para ler a sentença.
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